15 anos sem Cu(ba)

INDIANÁPOLIS (sobre Miami) | É um aeroporto totalmente diferente daquele que vi há nove anos. Ou estava em outra parte daquele que foi considerado o melhor lugar para pousar e decolar dos EUA no ano passado. O lugar do qual Tamara já está cansada.

Por ser uma provável indelicadeza, em qualquer língua ou em qualquer país, perguntar a idade de uma dama, arrisco que seus cabelos ruivos tendendo ao fogo, mais as rugas de expressão, escondiam mais do que 50 anos. Como aqui é um pedaço do Caribe ou da América do Sul, falava com destreza o espanhol. Até porque era cubana.

Funcionária da American Airlines, a conversa com Tamara fluiu depois de ela me responder com a paciência que não tinha onde deveria ir para ir a Indianápolis. Apontou o D35, à esquerda, enquanto Carsten fazia o check-in do qual me livrei. Uma sequência de americanos e hispânicos a enchiam de perguntas e o saco, se o tivesse. Uma piscadinha simpática a mim, e mais uma resposta pleonástica ao passageiro que perguntava se era um vôo doméstico, algo que a placa azul enorme logo acima explicava perfeitamente.

Falei que não deveria ser fácil trabalhar tendo de seguir um roteiro. Tamara fez a feição típica de quem está enfadada. Já são 15 anos nessa vida. Quis saber de onde eu era, e quando lhe revelei, expressou uma das admirações mais comuns. “Me encanta la caipirinha”, esfregou as mãos. Foi para o Rio duas vezes, até Foz do Iguaçu conheceu, mas nunca foi a São Paulo. Interrompeu a conversa para resmungar das pessoas que, em nosso bom português, não têm simancol. Seguiu questionando para onde eu ia, e quando se lembrou que já sabia, contou que havia morado na capital de Indiana. “É muito frio lá. Não agora, mas no inverno…”

E a senhora de feição comum a nós deixou de lado todas as dúvidas dos passageiros e começou a divagar sobre a proximidade das nossas raízes, as expressões que em Cuba e no Brasil são as mesmas, “porque às vezes não entendo o que gente da Colômbia, do Equador ou da Venezuela fala”, e ela percebeu que tinha de voltar ao trabalho, ao capitalismo consumista e voraz das viagens que nunca teve na Cuba que deixou. Carsten resolveu-se, Tamara acenou efusivamente, e fomos.

Olhei para trás, e ela mantinha o sorriso ao passageiro que acabava de lhe perguntar algo provavelmente repetitivo e banal. Era o jeito dela.

Comentários

  • Putz, cara… sou teu fã!! Sério mesmo… você escreve absurdamente bem! Lendo isso e de imaginar a cena perfeitamente, dá até vontade de ter um blog! Sério, parabéns!!!

    VM responde: É nessas horas que eu nem sei o que responder. Muito obrigado, Rafael. Sério mesmo.