O calvário de Tony

SÃO PAULO | Com um não tão leve incômodo no estômago, que deve ter atingido fígado, baço, pâncreas, rins e apêndice, provocado por um suco de laranja cretino de uma famosa cadeia de hambúrgueres, optei pelo descanso forçado neste domingo, mas não pude deixar de acompanhar o dramático Bump Day em Indianápolis.

Foi melhor que a maioria das corridas que vi no ano, certamente. O esquema de haver um número limitado de vagas e cachorros grandes passando perrengue para se garantir no grid de 33 carros é um dos espetáculos à parte da prova mais importante do mundo. E eram dois cães fortes, Tony Kanaan e Paul Tracy — que Rodrigo Borges costuma tratar injustamente de ‘Porcanadense’. Retaguarda de equipe grande ambos tinham. Mas talvez nem a melhor equipe surgida em toda a história do automobilismo seja capaz de explicar o pecado que estes dois cometeram por sofrer tanto ali.

Kanaan bateu no sábado durante o treino classificatório que fatalmente lhe poria no top-10. A Andretti foi, trabalhou, mexeu aqui e ali, e no domingo de manhã, nos treinos livres, lá ia Tony para o muro. Aí foi tipo a vó que quer fazer o bolo, mas não tem os ingredientes. Houve um esforço conjunto dos mecânicos de quatro dos cinco carros da equipe, que teve partes do carro batido, dos carros titular e reserva do tranquilo Ryan Hunter-Reay e do carro principal de Marco Andretti.

Enquanto a agonia era visível, os demais — tipo Bruno Junqueira e Vitor Meira — chegavam a marcas que não os preocupariam num futuro bem próximo. Eram 13 carros/pilotos para nove vagas, da 25ª a 33ª. O grid foi preenchido. E assado naquele sol escaldante, o bolo de Kanaan não poderia sair do que jeito que todo mundo queria.

Nos treinos livres, o reboco de carro de Tony andava 0.3 mph mais lento que o último colocado do grid, o fatalmente eliminado Sebastián Saavedra — que tem como mentor o simpático colombiano Roberto Guerrero. Veio a hora de classificar, e algo acima de 224 mph de média. Um 30º lugar ainda não muito confortável, à frente de Mario Romancini, Jay Howard e Tracy.

Takuma Sato seguiu Kanaan e colocou a KV à frente do brasileiro, empurrando-o para 31º e tirando Tracy, seu companheiro, do grid. A melhora significativa de Romancini, que tinha lugar por ora seguro, mas preferiu o risco de abortar sua classificação para se livrar da navalha, jogou TK para a zona de alerta. Howard aparecia, então, em 33º, precedendo Tracy e o quase morto Saavedra, que nem carro tinha mais para treinar, face o acidente que sofreu tardiamente no domingo.

Howard e Tracy tinham mais carro que Kanaan naquele momento, a verdade é essa. E os dois decidiram ir à pista. Howard não era obrigado, digamos assim. Tracy só podia fazer aquilo. Ao partirem para uma nova tentativa, perderam seus tempos anteriores. Nisso, Saavedra voltou a figurar no grid. E Howard e Tracy mataram um ao outro. Porque mal conseguiram ser mais rápidos que Sebastián.

O “eu não mereço isso” de Tony depois da vaga assegurada, em 32º, é sintomático. Kanaan já perdeu duas corridas ganhas em Indy e tinha pelo menos em outras duas chance de vitória. Tracy, então, não engole a ‘derrota’ de oito anos atrás nem por um boi no rolete. “Eu me sinto como em 2002”, desabafou.

Aquela avó do bolo certamente já houve de dizer que, quem muito quer, nada tem. Indianápolis tornou-se uma obstinação tamanha para os dois que acabou se transformando ao longo dos anos em um fardo do tamanho do autódromo. PT não vai ter essa chance agora, mas TK, que nunca havia largado em Indy acima da sexta posição, pouco pode esperar saindo em penúltimo, ainda que tenha mais de 800 km pela frente no domingo que vem. Scott Goodyear quase venceu em 1992 assim, disputando até o fim com Al Unser Jr. — é que Goodyear é o antecessor desta lista dos zicados, tipo em 1995, quando passou o pace-car antes da relargada no fim da prova e deu a conquista para Jacques Villeneuve.

Mas sinceramente até acho bom que Tony praticamente comece do zero. Que deixe rolar. Vai que assim, só assim, os deuses que guiam o automobilismo, tão cruéis com Kanaan em todos estes anos, sejam capazes de dar a ele uma glória que entraria para a história.

Comentários

  • Eu vi o treino, foi demais mesmo! tomara que na corrida, ele consiga mandar bem com um acerto melhor para corrida. Certamente essa prova promete muito.VICTOR MARTINS, você vai estar nessa prova em Indianápolis?

  • que será uma bela corrida , todos sabem …porém , seria mais interessante ver oq michael andretti fará com seu grande piloto , o tony !!
    se sonhar nao paga nada..pq nao tony em 1o ??
    torcida é o que nao falta !
    força nariga !!

  • O howard e Tracy foram muito burros, acho principalmente o PT, pq quando o howard foi pra pista e nao melhorou o tempo, ele estava dentro e nao precisaria tentar de novo.
    O que ficou evidente ali foi que a pista piorou demais no final do dia. E eles ja deviam saber disso apos a semana de treinos, e anos de dados de telemetria dessa pista.
    Mas eh engracado pq o Tracy fez o 2o tempo durante a semana e o Howard foi o mais rapido do treino antes do bump, ninguem esperava por isso, assim como ninguem esperava ver TK no fim do grid.

    • A definiçõa do grid sábado e domingo foi melhor que a maioria das corridas nos ultimos anos (de todas as categorias). Ano passado Hélio ganhou como uma história de cinema. Quem sabe nãodá Kanaan com outra história de cinema?

      Tracy e Howard de fora foram surpresas, tinham bons carros. O tempo do Junqueira foi fantástico, se tivesse se classificado no sábado estaria no Fast Nine. Obteve isso quase sem treino.

      É lógico que prefiro a vitória do Hélio, depois do Kanaan. Mas torço muito pelo Tagliani. Ele e sua equipe vem fazendo um trabalho fantástico esse ano. Tanto ele quanto o Junqueira podem surpreender.

  • Certamente o Tony é um grande piloto, ninguem se mantem de certa foram em evidência se não for competente não se sustenta. mesmo não sendo “midiático” no Brasil, é respeitadissimo nos EUA, que concondem ou não tem o automobilismo mais autêntico. A formula 1 é mais evidente porém não é natural, tudo é muito “construido”, muito mais negócio que competição. Na Indy é diferente, se não tiver competição, não tem negócio.

    Acho que se não levar a taça, chega a disputar em pé de igualdade. É conhecido que se tenha surpresas, como aconteceu com o próprio Emerson ( me falha o ano ), que estava a poucos metros/milhas de colocar uma volta no 2º colocado, que era nada mais nada menos que o Al Unser Jr. ( da pesnke, também ). Saindo da curva 4 , Emerson deixou sua marca no muro.

    Que a prova seja emocionante, mas surpresas são o tempero desta prova.

  • O duro é que lá eles classificam o carro, e não o piloto, e aí o Tony vai ter que correr com esse carro frankenstein que ele arrumou pra classificar.

    Talvez dê pra dar uma acertada no carro mas vai saber em que estado ele vai chegar pra corrida… Uma pena, torço para que o Tony se dê o melhor possível nessa corrida.

  • Tony se tiver o carro parecido com o de antes das batidas tem chances de grande resultado mesmo largando la atras. Grande piloto que é, aposto que passa 10 carros na primeira volta. Outro cara que tem chances de vitória e a historia dele nessa prova merece um bom post seu, é o Bruno Junqueira. A Fazzt está incrivelmente rápida e o Bruno ja conhece os caminhos de Indy. Se tiver tempo de acertar o carro, deixando parecido com o de Tagliani, vai dar trabalho.