Uma história de vida

SÃO PAULO | Foi por acaso que minutos antes da meia-noite de ontem resolvi zapear a TV e cair na ESPN HD. Lá passava um programa que, na verdade, se trata de uma série ’30 for 30′, documentários sobre histórias específicas que são abordadas de uma forma ampla por seus protagonistas e experts. O caso era o de Vlade Divać, um dos grandes jogadores de basquete da história da Iugoslávia e depois Sérvia, e de Dražen Petrović, outro destes gênios da bola laranja, iugoslavo, mas croata.

Unidos, Divać e Petrović fizeram a nação unida ser maior que os Estados Unidos e a União Soviética. Mas a diferença étnica que existia entre os povos, acobertada durante anos e aflorada na queda do socialismo na Europa no início dos anos 90, tornou-se fatal para a amizade entre os dois. O motivo da separação, não a dos países, se deu na final do mundial, quando Divać, ao ver um torcedor invadindo a quadra com a bandeira da Croácia, tomou-a da mão e jogou no chão.

Aquele ato do pano arremessado mudou as vidas de todos, enquanto a guerra pela emancipação dizimava os povos. Divać virou inimigo dos croatas, Petrović junto. Sempre tentou a reconciliação, em vão. E nestas coisas da vida, Petrović, sem perdoá-lo, morreu em um acidente de carro três anos depois.

A história de ‘Once Brothers’ parece simples contando assim. Mas é carregada porque, além da política e da situação beligerante, mostra alguém como Divać, que só defendia uma Iugoslávia unida, foi mal interpretado, esperou 18 anos para voltar a andar no território croata, encontrou a mãe de Petrović e visitou o túmulo daquele que sempre quis ter como amigo — e confessa a dor que vai carregar para sempre. Havia muito tempo que não chorava vendo algo do tipo. E posso assegurar que, além de ser a melhor coisa que vi na TV neste ano, é uma das cinco melhores a que assisti em todos estes anos.

No YouTube, aqui está a primeira das seis partes, sem legenda. E como o André lembrou nos comentários, Divać está a cara do Celso Miranda.

http://www.youtube.com/watch?v=3hOst_NExGI

 

Comentários

  • Não tenho TV por assinatura e por isso não assisti ao documentário, mas viajando no fim de ano assisti no hotel ao episódio “The Fab Five”, que fala sobre o timaço de basquete da Universidade de Michigan no início dos anos 90. É excelente. Aliás, é imensa a diferença de qualidade dos programas (e da maioria dos comentaristas e narradores) dos canais por assinatura, como a ESPN, em relação aos da TV aberta (exceto TV esporte Interativo).

  • Quando o Goran Ivanisevic (croata) finalmente consegui ganhar Wimbledon (convidado pela organização como homenagem, depois de 3 finais perdidas), em 2001, ou seja, 8 anos depois da morte do Petrovic, ele dedicou o título a ele, logo após o jogo.
    Disse que ele era o melhor jogador de basquete da Europa, e que ele vinha esperando todo este tempo pela oportunidade de dedicar o título ao seu amigo…
    Inclusive, quando ele aterrisou na croácia com a taça, usava uma camisa do NJ nets do petrovic.

  • Realmente, Victor: é um excelente documentário. Não tem como não se emocionar assistindo esse episódio da série. A gente acaba torcendo para que haja um ‘final diferente’, o que não acaba acontecendo, infelizmente.

  • Quem precisa assitir ao filme da Bruna Surfistinha quando temos esse documentário cativante e emocionante para contar?

    “Para construir uma amizade, são necessários anos; para destrui-lá, apenas um segundo”. A lição que nos deixa é que a vida é muita curta para nutrir inimizades.

  • é um belo documentário, foi triste o drazen morrer daquele jeito sem sequer fazer as pazes com Divac. e Drazen jogava muito, chegou a fazer 100 pontos em uma partida e na NBA tinha se encontrado no New Jersey Nets, que estavam apostando muito nele pro futuro. e sou fã do Divac, jogou muito no Lakers e Sacramento. enfim, uma amizade destruida por causa do um separatismo idiota.

  • realmente, Vitonez, esse documentário, dentre os poucos que vi da série, é o que me levou às lágrimas, a cada 5 minutos.
    além da história central, do Divac indo à Croácia, visitar a mãe do colega falecido e indo a seu túmulo, me impressionou muito uma bela sequência montado com registro em vídeo e muitas fotos do funeral do Drazen. é um excelente trabalho cinematográfico, no fim das contas.

    tenho um sobrinho jornalista cujo esporte favorito é o basquete, e quando comentei desse filme – ele já conhecia, aliás ele tem a caixa dos filmes dessa série – me contou de uma antológica partida de basquete na Europa (creio que do campeonato italiano) que virou lenda, e por isso muito vista no utube: num time jogava o Drazen, no outro o brasileiro Oscar.
    os dois tiveram performances fantásticas, Oscar assinalou 55 (cinquenta e cinco!) pontos – mas o Drazen marcou ainda mais que isso. a partida entrou para a história porque foi praticamente um duelo só entre os dois.

  • Victor… essa série é sensacional!

    Este “Once Brothers” é muito bom. Precisa ser muito frio não se emocionar.
    Eu assisti vários e indico:

    – Into the wind;
    – The Two Escobars
    – The band that wouldn’t die;
    – Muhammad and Larry;
    – June 17, 1994;
    – Four Days In October.

    Há outros 9 documentários não incluídos nos 30. Ontem assisti “Catching Hell”. Não entendo o porquê de não incluírem este no pacote dos 30. É muito interessante. Basicamente, conta a história do torcedor Steve Bartman do Chicago Cubs (MLB) sendo perseguido por todos. A cidade de Chicago deve um pedido de desculpas à este torcedor. Se puder assistir vale a pena.

  • Esta série é fantástica: Reneé (a primeira transexual a disputar o Aberto de Tenis dos EUA), The Band that Wouldn’t Die (sobre a banda dos torcedores do então time do Baltimore Colts), Without Bias (sobre a promessa Len Bias morto por overdose apos ser “draftado” pelo Celtics) e especialmente pra quem é fã de automobilismo, Tim Richmond: To the Limit (contando a história de Tim Richmond, promissor piloto da NASCAR que faleceu em decorrencia de AIDS no final dos anos 80).

  • Muito bom, Victor.

    Esse relato e este vídeo só demonstram que esses separatismos por modismo extravagante que tomou conta dos países pós-socialistas são verdadeiros enfraquecedores da coesão social necessária à construção de qualquer grande nação.

    Ou seja… separatismo é uma mer…

    Quando eram Iugoslávia, União Soviética e Tchecoslováquia unidas, embora federadas entre repúblicas autônomas, eram bem mais fortes! Não só no esporte, mas tinham potencial para, em uma economia de mercado, ter maior peso econômico.

    Agora estão todos fragmentados, mendingando vaguinha na União Europeia, a beira de uma crise econômica endêmica…

    Isso serve de exemplo para que aqui no Brasil não alimentemos separatismos inúteis e extravagantes, de paulistas que odeiam nordestinos, de sulistas que se acham europeus, e por aí vai…

    A união entre as pessoas é mais importante que a micro-nacionalidade ou regionalidade.

    • Oi Antonio Pessoa.
      Concordo contigo a respeito de separatismo: é uma merd*.
      Mas no caso da Yugoslavia, o separatismo não foi por conta de modismos.
      O único que conseguiu juntar Servios, Croatas, Slovenos, Macedônios e Montenegrinos em uma república foi o Marechal Tito e a União Soviética.
      A Gerra nos Balcãs vem de muito longe e a diferença entre os povos é muito grande. Só a força para juntá-los.
      Quando a força acabou, era natural que se separassem. O que ninguém queria era o banho de sangue que ocorreu por lá.
      Sou filho de mãe sérvia, mas nunca senti qualquer bronca por parte dela com qualquer dos outros povos.
      Quanto ao documentário, foi maravilhoso, pois torcia pela seleção Yugoslava tanto no basquete como no futebol.
      Abraços

  • Essa série 30 For 30 é espetacular, consegui assistir uma meia dúzia de episódios. E me dei de presente de Natal a caixa com os 30 documentários, que está em promoção na Amazon.

  • Tem outros bons desta série. Into the wind, Muhammad and Larry, The 16th man, The two Escobars, The birth of big air – são os que lembro.

  • Esse documentario dessa relação entre Divac e Petrovic, é muito bom. Assisti tres vezes. É uma verdadeira lição de vida. Excelente!

    É muito bom tb o Two Escobars, que relata a cultura e a problematica do Futebol Colombiano com o Narcotráfico. Também Excelente!

    Bom também é a liga Confidencial. – Vc aprende algumas coisas.

  • Sem contar que foi muito bem dirigido: as situações opostas que cada um dos dois vivia também foi fator determinante para que o estopim fosse estourado. Não que o Petrović tivesse inveja de Divać (seria muito besta e simplista isso), mas o fato de ele estar encostado nos Trailblazers trouxe muita amargura para a vida do rapaz.

    Vi uns 3 episódios desse ’30 for 30′. Sem dúvida, esse foi o que mais me provocou.

  • É brilhante mesmo.
    E como te disse via Twitter, recomendo da mesma serie o Two Escobars, sobre Andrés Escobar, zagueiro colombiano assassinado após o Mundial de 94, e Pablo Escobar, filhote de Scarface com Robin Hood.